por Jorginho
Imagine a seguinte cena: você trabalha feito um condenado, acorda às 6h da manhã, enfrenta o busão lotado, engole uma marmita meio fria no almoço e, no fim do mês, recebe aquele salário CLT — já previamente mutilado pelo INSS, vale-transporte, vale-refeição e a taxa invisível chamada “esperança frustrada”. Aí vem o governo e diz: “Boa notícia! Agora você pode usar seu salário… para se endividar mais rápido e com aval oficial.”
Senhoras e senhores, eis o glorioso Consignado CLT, a nova modalidade de empréstimo que nos oferece, com sorriso no rosto e PowerPoint em mãos, a oportunidade única de vender o próprio FGTS em suaves prestações com desconto em folha. É o que chamamos no mercado de “financiar o próprio sufoco com desconto direto do seu sonho de aposentadoria.”
E o melhor: a propaganda vem com o selo da empatia governamental. Dizem que agora o trabalhador poderá “comparar taxas”, “migrar para juros mais baixos” e “exercer sua autonomia financeira”. Traduzindo: você vai pegar um empréstimo pra pagar outro empréstimo que pegou pra tentar pagar aquele empréstimo anterior que surgiu porque seu salário não cobre nem a cesta básica sem cesta.
E qual é a garantia? O seu futuro desempregado. Literalmente.
Com esse modelo, você antecipa 10% do seu FGTS e 100% da multa rescisória — ou seja, se for mandado embora, não leva nem o troco do pão. E quem sabe você até consiga usar essa grana pra pagar a fatura do cartão de crédito, que está em rotação desde 2019.
A desculpa é sempre a mesma: “taxas civilizadas”. Civilizadas pra quem? Porque, honestamente, um juro de 3% ao mês no Brasil é o equivalente financeiro de um tapa na cara com luva de pelica — elegante, mas ainda dói.
Mas não se preocupe, dizem que você poderá baixar o aplicativo da carteira digital, comparar propostas e encontrar aquela taxa imperceptivelmente menos selvagem. Tudo isso enquanto tenta lembrar qual dos seis aplicativos bancários você ainda consegue acessar porque esqueceu a senha de todos.
A FEBRABAN, claro, está empolgada. Afinal, os bancos não são vilões — são apenas prestadores de serviço altamente rentáveis com histórico de lucro trimestral pornográfico. Para eles, o CLT consignado é um sonho: dinheiro garantido via desconto automático e um cliente cativo, sem chance de dar calote, a não ser que suma do planeta ou morra — o que, inclusive, será descontado do FGTS mesmo assim.
E aí vem a cereja do bolo: se você mudar de emprego, a dívida vai junto com você. Parabéns, trabalhador! Agora além do seu crachá, você também carrega sua dívida no crachá espiritual. É como um CPF devedor com GPS: a dívida te acompanha por onde você for. Amor eterno. 💔
E enquanto isso, a elite política vive de auxílios: moradia, gasolina, paletó, gravata, terapia emocional para lidar com CPI. Já o trabalhador… esse ganha a chance de fazer um “leilão de juros” com a própria dignidade.
Então, caro leitor CLT, se você ouvir por aí que agora pode contratar um empréstimo com “taxa civilizada”, desconfie. Porque o que começa com civilidade financeira geralmente termina com você abrindo o holerite e chorando em posição fetal.
E no fundo, todos sabemos: não é inclusão financeira. É só a pobreza sendo oficialmente parcelada.