por Tullio Dias
Lá em 2009, eu saí de um show do Oasis achando que tinha visto algo especial. E vi. Foi especial porque acabou logo depois. Liam e Noel brigaram (mais uma vez), cancelaram a banda (mais uma vez) e o que era um sábado à noite em São Paulo virou um tipo de fim de era para quem cresceu ouvindo britpop em fones de ouvido surrados.
Avanço rápido para 2025: Liam Gallagher, Andy Bell e Gem Archer subindo ao palco para tocar o “Definitely Maybe” na íntegra, comemorando 30 anos do álbum. Sábado e domingo de Allianz Parque tomado por gente que esperou 15 anos por esse revival. E eu estava lá de novo — pronto para redescobrir o que era ser fã daquela banda que me apresentou ao caos melódico do rock inglês.
Um Telão, Um Disco e Um Começo com Arrepio
A noite começa com trechos de entrevistas antigas. Liam dizendo que “a música não é sobre vender camisa ou rede social, é sobre mudar sua vida”. O estádio inteiro calado, respirando aquela frase como se fosse evangelho.
E aí explode “Hello”. Com o vocal rasgado de um Liam mais velho, mais sábio — e talvez até mais afinado — do que aquele de 2009. A banda inteira alinhada. O som estourado em alguns momentos, mas a energia preenchendo cada centímetro do estádio.
Não era só nostalgia. Era agressividade. Era entrega. Era um chute na porta do presente feito com coturnos dos anos 90.
O Peso do Tempo (E dos Hits)
A proposta era clara: tocar o “Definitely Maybe” do início ao fim. Missão cumprida. Mas o que pegou mesmo foram os extras. “Whatever” surgiu como um hino inesperado, com projeções que incluíam Talk Tonight, Little James e até Cast no Shadow— uma piscadela para os fãs mais deep cut.
Teve “Slide Away”, teve “Live Forever” com todos os celulares do estádio brilhando ao mesmo tempo (numa das raras vezes em que eles serviram pra alguma coisa além de atrapalhar), e claro, teve “Champagne Supernova” encerrando tudo com guitarras que mais pareciam uma tempestade.
A Plateia Que Vive Pra Gravar (E o Show Que Era Melhor Vivido)
Vamos falar a real: parte do público parecia estar mais preocupada em filmar o show do que em vivê-lo. Parecia fila do Procon versão TikTok. Cada solo de guitarra vinha seguido de uma floresta de braços com celulares apontados para o nada.
Teve uma moça que passou 15 minutos tentando tirar selfie com o palco ao fundo, sem sucesso. Teve um rapaz que perdeu “Wonderwall” porque estava gravando stories reclamando do banheiro.
Sorte do cara que não estava passando Jogos Mortais, porque a tortura visual ali era digna de Jigsaw.
E Ainda Assim, Foi Inesquecível
Porque no fim das contas, a música vence. O som da banda vence. A emoção de ouvir “Supersonic” com o coração batendo no mesmo BPM da bateria vence.
Liam estava no modo “entidade britânica concentrada”. Raivoso, debochado, carismático. E o público que veio por ele — e não por 10 segundos de reels — saiu de alma lavada.
E o Domingo? Foi Melhor Ainda (Mas Isso é Outra História)
Minha esposa vai contar sobre o segundo dia. Mas adianto: menos celulares, mais emoção, mais fogos, mais lágrimas.
E eu? Eu fiquei ali, parado, com aquele sorriso besta de quem sabe que viveu algo único. Porque, sim, é verdade: talvez a única excomunhão realmente eficaz ainda seja aquela feita sentado — porta trancada, papel higiênico ao alcance e nenhum idiota iluminando a escuridão com um celular.

