mais um partido missão

Crônica: O Partido Missão e a Multiplicação dos CNPJs Sagrados

O Brasil acordou nesta terça-feira com uma boa notícia — se você for dono de gráfica, marqueteiro político ou advogado eleitoral: nasceu mais um partido.
Sim, o partido Missão, do pessoal do MBL, foi aprovado pelo TSE e agora somos oficialmente um país com 30 legendas registradas. Trinta. Ou, em linguagem bíblica, “trinta filhos do mesmo pai ausente chamado senso de responsabilidade”.


“Missão” — o nome já vem com ironia embutida

O novo partido promete “resgatar valores” e “transformar o Brasil”. Porque, claro, o que faltava para resolver a inflação, o caos urbano e o preço do leite era mais um logotipo colorido e uma conta bancária com acesso ao Fundo Partidário.
O MBL, aquele movimento que surgiu gritando “não queremos políticos”, agora tem… um partido político.
É o equivalente ideológico de um vegano abrindo uma churrascaria.

Renan Santos, o presidente da nova sigla, celebrou o registro com a empolgação de quem acaba de desbloquear o “modo profissional” no jogo da política: agora ele pode indicar cargos, disputar fundo eleitoral e fazer horário político com frases como “nossa missão é o Brasil” enquanto uma bandeira tremula ao fundo.


O Missão chega com um número: 14

O mesmo número que já foi do PTB, aquele partido que virou o Partido Renovação Democrática — nome que, convenhamos, soa como uma reforma de fachada em prédio condenado.
Agora o 14 passa a simbolizar a “nova direita digital”, uma mistura de liberalismo de WhatsApp com indignação sob medida para stories do Instagram.


O TSE aprovou, mas o povo…

O TSE confirmou que o partido cumpriu todos os requisitos legais: assinaturas, diretórios e estatuto.
O que ele não pode confirmar é se alguém realmente quer mais um partido.
No país onde as pessoas confundem “voto nulo” com “voto branco”, temos 30 legendas oficiais e outras 24 em formação.
A política brasileira virou um reality show onde cada ego quer sua própria sigla, e cada sigla quer seu próprio pedaço do fundo eleitoral.


Do “fora todos” ao “tô dentro”

O MBL, lembrando, nasceu com a bandeira da antipolítica.
Eles organizavam protestos com cartazes pedindo o fim dos privilégios, o corte de verbas públicas e o impeachment de quem quer que estivesse no poder.
Agora, depois de uma década, o movimento que começou gritando “fora corruptos” estreia gritando “entra CNPJ”.
É a revolução liberal que termina em diretoria executiva e cargo comissionado.


E o nome “Missão”?

É quase poético.
Porque, de fato, fundar um partido no Brasil é uma missão:
reunir 577 mil assinaturas, abrir diretórios em nove estados, submeter estatuto, criar logomarca e, principalmente, encontrar uma forma de parecer diferente sendo igual a todos os outros.


O Missão é mais um sinal dos tempos

O Brasil vive o paradoxo perfeito: as pessoas dizem odiar a política, mas continuam criando partidos como quem abre franquia de açaí.
Tem partido que defende a pátria, outro que defende Deus, outro que defende o agronegócio e agora, aparentemente, um que defende o algoritmo.

A “nova política” virou uma feira de vaidades: cada influencer com seu fundo partidário, cada ideólogo com seu estúdio de podcast, e cada “missão” com seu boleto aprovado pela Justiça Eleitoral.


E assim seguimos

Trinta partidos.
Trinta logotipos.
Trinta missões.
E um único país, que continua tropeçando no mesmo buraco enquanto os salvadores da pátria atualizam o nome da sigla.

No fim das contas, o Missão tem um mérito: ele conseguiu unir esquerda, direita e centro em um sentimento comum — o constrangimento.

Porque, se essa é a nossa missão, talvez o Brasil precise urgentemente de um botão de “reiniciar sistema”.